sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Miscigenação e Democratização Social no Brasil

Abordaremos nesse texto a questão da miscigenação presente no prefácio de Casa grande e Senzala, e uma de suas principais consequências na visão de Freire, a democratização social no Brasil.
        O autor destaca que as relações entre os brancos conquistadores e as demais “raças” (negra e indígena) foram condicionadas desde o primeiro momento da colonização, por dois fatores. Por um lado pelo mundo trabalho baseado no sistema de produção escravista do latifúndio e da monocultura, e do outro lado no campo das relações sociais pela miscigenação, devido em grande parte pela escassez de mulheres brancas, um problema crônico na colônia. Os portugueses conquistadores do território devido a sua superioridade técnica e militar sobre as populações indígenas, também eram os dominadores e senhores absolutos sobre uma enorme massa de africanos negros importados e escravizados para trabalhar nas plantações e nas demais atividades produtivas da colônia.


        No entanto, devido à escassez de mulheres brancas, Freire identificou “a criação de uma zona de confraternização entre vencedores e vencidos”, um eufemismo para descrever “as relações sociais e genéticas” entre os brancos europeus e as mulheres negras e indígenas, as quais foram colocadas na condição de objetos de satisfação sexual dos homens brancos. Essas relações foram de poder e opressão dos homens sobre as mulheres consideradas de “raças inferiores”. No caso senhores “sádicos e desabusados” exploravam sexualmente escravas passivas. Porém, segundo Freire, algumas relações que se “adoçaram” devido à necessidade de muitos colonos constituírem famílias, se transformaram em relações oficiais e aceitas na sociedade, apesar de fundadas em uma base patriarcal e opressiva.

        Ainda segundo Freire a miscigenação ajudou a reduzir ou corrigir a distância que de outro modo se conservaria imensa entre a casa grande e a mata atlântica e entre a casa grande e a senzala. Logo, a mestiçagem contribuiu como um contraponto entre a “aristocratização” da sociedade, pois a estrutura monocultora escravocrata colocava num polo senhores e no outro os escravos, enquanto a miscigenação agiu em sentido oposto para aproximar socialmente esses extremos.
        Como consequência a conclusão a que Freire chegou foi que o resultado dessa miscigenação, filhos legítimos e ilegítimos, serviu para subdividir por meio das heranças parte considerável das grandes propriedades, quebrando assim a força dos latifúndios que concedidos através de sesmarias eram do tamanho de reinos, o que promoveu, ou ajudou a promover a democratização social no Brasil. Uma visão controversa e romântica tendo em vista a grande concentração de propriedade fundiária no país. Freire não se deu em conta que a grande massa de mestiços constitui hoje em dia a maior parte dos empobrecidos e despossuídos, um detalhe que passou despercebido em sua análise.

Luiz José Palhares de Souza Freitas é historiador (USP) e discente do Bacharelado de Ciências e Humanidades da UFABC.

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